Maria Caetano, de 67 anos, nasceu a 25 de março de 1957 no bairro Santos Nicolau, em Setúbal. Filha de varinos, desde criança começou a cantar, apesar da repressão dos pais que eram contra uma carreira artística. Apaixonou-se pelo fado, aos 12 anos e chegou a cantar com Gualberto Caferra, uma referência do fado na cidade de Setúbal, em alguns espetáculos. Perdeu o pai aos 15 anos e deixou de cantar publicamente durante 32 anos, mas incutiu o gosto dos filhos pela música. Só voltou ao fado há 15 anos. Desce então nunca mais parou. Gravou três discos de fado e folclore “Nas Asas da Liberdade”, “Meu fado Minha Voz” e “Folclore/Fado Popular Português”, dedicado à mãe. No próximo dia 7 de abril, pelas 15h30, no auditório Bocage vai lançar o trabalho discográfico “Fado Viajante do Tempo”, só com poemas de José Raposo e música de fado tradicional. A capa é uma aguarela de Lurdes Pólvora d’Cruz. O espetáculo terá muitos convidados, entre os quais, António Pinto Basto.
Florindo Cardoso
Setúbal Mais – Como surgiu a ideia de lançar este novo trabalho discográfico?
Maria Caetano – Foi numa tarde de poesia na Galeria Lurdes Pólvora d’Cruz, quando declamei um poema de José Raposo, um dos poetas que mexe com a minha alma, e pensei que não poderia ficar por ali. Sendo muito impulsiva, decidi na hora que iria fazer um trabalho discográfico “Maria Caetano canta José Raposo”. Tenho a certeza que está aqui uma grande obra. Escolhi 17 poemas do José Raposo, dos quais gravei 13 para este CD. Considero que o José Raposo incarna a alma fadista e escreve poemas com sentimento de fadista. Fiz este trabalho discográfico com grande paixão. Tenho a certeza de que ficou uma obra histórica, tanto na parte dos poemas como na capa, uma aguarela da pintora Lurdes Pólvora d’Cruz e a minha voz. Os poemas são acompanhados de músicas do fado tradicional. A cada poema apliquei uma música de fado tradicional pelo qual sou uma apaixonada.
Setúbal Mais – Porque escolheu o título “Fado Viajante do Tempo”?
Maria Caetano – O fado é um viajante do tempo e tem persistido até agora, com avanços e traços de modernidade. Costumo dizer que o fado foi ao shopping e mudou de visual porque os poemas que se cantavam inicialmente, eram muito trágicos e mudou para poemas lindíssimos. A música tradicional manteve-se. Aliás, num fado pode aplicar-se várias músicas de fado tradicional e foi o que diz com os poemas de José Raposo.
Setúbal Mais – Quando vai ser o lançamento?
Maria Caetano – O lançamento será no dia 7 de abril, pelas 15h30, no auditório Bocage, com um espetáculo de fado com cerca de uma dezena de convidados, entre os quais, António Pinto Basto e o filho Gustavo Pinto Basto. Vou cantar oito temas deste CD que estará em exposição.
Setúbal Mais – Como começou o seu gosto pelo fado?
Maria Caetano – Desde pequena comecei a cantar. Tive sempre uma grande paixão pela música. Cantava tudo. O meu primeiro palco foi na escola aos sete anos. A professora descobriu que cantava e adorava ouvir-me. Inscreveu o meu nome num passatempo infantil da televisão, fui chamada, mas a minha mãe não autorizou. Fui muito reprimida artisticamente pelos meus pais, especialmente pela minha mãe. O povo varino tem muitas regras e naquela altura era muito difícil para uma mulher cantar. Apesar disso, fui cantando. Recordo que ao sábado ia ao mercado com a minha mãe e o senhor Virgílio, pai do Gualberto Caferra que tinha ali um talho, e sabendo que cantava, pediu autorização para levar-me a espetáculos, mas sempre com muita dificuldade. Aos 12 anos descobri o fado, mas tive de largar aos 15 anos devido à morte do meu pai. Parei. Fiquei sozinha com a minha mãe, casei, constitui família, divorciei-me e só há 15 anos voltei ao fado e nunca mais parei. Na altura, concorri ao concurso de fado das coletividades realizado no Grupo Desportivo Setubalense “Os 13” e tem sido uma caminha muito bonita. Cumpri o meu destino. Gravei o meu primeiro CD “Nas Asas da Liberdade”, sendo uma homenagem à liberdade que sempre quis e que durante muitos anos não consegui. No segundo trabalho “Meu Fado Minha Luz” escrevi as letras e no terceiro “Folclore/Fado” dedico à minha mãe que sempre me proibiu de cantar. A minha adorava folclore, fiz uma pesquisa de música popular portuguesa, e gravei esse trabalho. Aliás, tenho uma banda chamada “Folc/Fado” onde só canto folclore. Este ano, já temos um espetáculo marcado para 20 de abril em Lagameças (concelho de Palmela). O meu filho mais velho está na repercussão desta banda, onde também tenho dois acordeonistas excecionais. Todos os meus filhos estão ligados à música.
Setúbal Mais – Quais os próximos projetos?
Maria Caetano – Tenho um álbum pronto só com originais meus. Quero fazer mais um trabalho discográfico de folclore só com temas da Tonicha.
José Raposo:
“Sempre tive o desejo de ter um trabalho discográfico só com poemas meus”
José Raposo começou a escrever aos 50 anos, mais precisamente em fevereiro de 1998, quando a sua alma poética emergiu. Considera-se um poeta versátil e de rua, pois é nela que nascem a maior parte dos seus poemas. Há na sua poesia um encontro de sentimentos diversos, onde a realidade e o sonho se confundem numa perfeita sintonia. Vê o colorido da vida nas coisas mais simples, intercalado com fragmentos de uma realidade que viveu e amou de forma intensa. É dos poetas de Setúbal com mais letras de fado gravadas pelos artistas. José Raposo confessa que “sempre tive o desejo de ter um trabalho discográfico só com poemas meus”.
Setúbal Mais – José Raposo como foi receber este convite para este CD da Maria Caetano só com letras suas?
José Raposo – Fiquei emocionado. Tenho vários fadistas com letras minhas gravadas. Sempre tive o desejo de ter um trabalho discográfico só com poemas meus, deste tipo e quando recebi o convite da Maria Caetano foi uma felicidade muito grande. Entreguei 17 poemas e a Maria Caetano escolheu 13 para este CD. Somos amigos e ela já cantava letras minhas. Foi uma satisfação muito grande porque é preciso coragem para fazer um trabalho destes. Fiquei radiante e escrevi os poemas como “Fado Viajante do Tempo” em que escrevi em 10 minutos. Estou curioso em assistir ao espetáculo de lançamento. Costumo dizer aos fadistas que o meu cachet é o prazer em ouvi-los. Vou a quase a todas as sessões de fado, é a minha paixão. Tenho duas centenas de letras de fado esritas.