Rocha ornamental brecha da Arrábida recebe certificação da UNESCO

O trabalho desenvolvido pelos municípios da região na preservação da brecha da Arrábida foi destacado pelo presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Martins, num encontro em que recebeu a certificação desta rocha como Pedra Património Mundial.

Na sessão realizada, a 28 de julho, nos claustros do Convento de Jesus, organizada pela Câmara Municipal de Setúbal, pelo ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas e pela NOVA School of Science and Technology, André Martins recebeu um documento da União Internacional de Ciências Geológicas, parceira da UNESCO, que atesta a classificação da brecha da Arrábida como Heritage Stone – Pedra Património Mundial.

No evento, que assinalou o 47.º aniversário do Parque Natural da Arrábida, o autarca reafirmou a satisfação pelo reconhecimento da “importância histórica e da relevância arquitetónica das aplicações da brecha da Arrábida, aliadas aos valores geológicos, culturais e pedagógicos”.

“Se falo de satisfação, é mesmo esse o sentimento que nos ocorre quando sabemos que esta parte da nossa serra é vista como património mundial, uma distinção que, naturalmente, muito honra quem sempre se habituou a olhar para a Arrábida como algo de único e extraordinário.”

André Martins lembrou que os municípios da região de Setúbal “tudo têm feito para valorizar e proteger este património mundial”, em particular pela ação das câmaras municipais de Setúbal, Sesimbra e Palmela, que possuem territórios localizados no Parque Natural da Arrábida.

Uma das ações de maior relevo, indicou, é a candidatura da Arrábida a Reserva da Biosfera junto da UNESCO apresentada pela Associação de Municípios da Região de Setúbal em parceria com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

O autarca sublinhou que a “paisagem singular, rica em património geológico, ecológico e cultural” da Serra da Arrábida, em que “património natural e cultural, material e imaterial se encontram indissoluvelmente ligados”, confere uma “identidade geográfica única e excecional, que se pretende classificar e reconhecer como Reserva da Biosfera da UNESCO”.

Habitada desde tempos imemoriais, a Arrábida é palco de atividades económicas diversas, sendo as mais características a pesca, a agricultura, a pecuária, a apicultura, e a produção de vinho, queijo e outros produtos regionais de qualidade comprovada, sem esquecer o turismo.

“É, pois, da maior importância recordar hoje, quando os municípios de Setúbal, Palmela e Sesimbra recebem este certificado que reconhece as características únicas da brecha da Arrábida, que precisamente neste dia, em 1976, foi criado o Parque Natural da Arrábida.”

O autarca defendeu que o Parque Natural da Arrábida “é uma obra ímpar que importa valorizar e continuar a proteger” e garantiu que a Câmara Municipal de Setúbal continuará a preservar este património “com o respeito escrupuloso pelas regras em vigor” e com ações como o Arrábida Sem Carros, que visa garantir o acesso em segurança às praias da Arrábida e retirar a carga de trânsito que, nas épocas balneares, sobrecarregava esta área natural.

A brecha da Arrábida junta-se às duas pedras que haviam alcançado este estatuto em Portugal, o mármore de Estremoz e o calcário lioz, passando a integrar o restrito leque de 32 rochas classificadas a nível mundial pela Subcomissão do Património Geológico da União Internacional de Ciências Geológicas, entidade parceira da UNESCO na área da geociência.

“Esta certificação comprova a importância da brecha e o seu uso excecional ao longo dos tempos. É para mim um enorme prazer entregar, em nome da União Internacional de Ciências Geológicas, esta distinção única aos setubalenses na mão do presidente da Câmara Municipal de Setúbal”, afirmou o diretor da NOVA, José Júlio Alferes.

O processo que culminou com a certificação da brecha da Arrábida como Pedra Património Mundial foi iniciado em 2019, numa investigação que contou com o envolvimento da Câmara Municipal de Setúbal no apoio à realização de um conjunto de visitas ao terreno e na disponibilização documental.

A investigação à rocha ornamental exclusiva da Serra da Arrábida foi conduzida por um grupo de cientistas liderado pelo presidente da Sociedade Geológica de Portugal e investigador da GeoBioTec da Nova School of Science and Technology, José Carlos Kullberg, juntamente com António Prego, Luís Lopes, Tiago Alves e Ruben Martins.

A publicação de um artigo científico na revista Geoheritage, no qual os investigadores abordam a importância histórica e arquitetónica daquela rocha e definem uma proposta de plano de salvaguarda, impulsionou a candidatura.

José Carlos Kullberg recordou que a brecha da Arrábida tem “particularidades” que atrasaram um pouco o processo de certificação e obrigaram a aumentar a equipa de investigadores.

As últimas pedreiras encerraram na década de 70 do século XX devido à classificação de zonas protegidas decorrentes da criação do Parque Natural da Arrábida, “o que impossibilita a exploração do recurso desde essa altura”.

Após alguma pesquisa, os investigadores descobriram uma empresa que ainda tinha uma pequena reserva da brecha da Arrábida, o que “ajudou a fazer a caracterização geotécnica e, assim, complementar a candidatura a Património Mundial”.

Uma das ideias apresentadas pelos investigadores para a preservação é a colocação em local protegido dos últimos blocos de pedra extraídos na pedreira do Jaspe, antes da interdição das pedreiras no Parque Natural da Arrábida, para que possam ser usados no restauro de monumentos.

José Carlos Kullberg apelou, igualmente, a “uma maior valorização e divulgação da pedreira do Jaspe” para que não se perca “o último local com enorme valor científico para a brecha da Arrábida”.

O encontro “A Brecha da Arrábida como Pedra Património Mundial” contou ainda com uma intervenção de Ana Cristina Falcão, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, que assinalou o 47.º aniversário da criação do Parque Natural da Arrábida.

“O PNA tem muitos valores faunísticos, florísticos e geológicos. Tudo temos feito no ICNF para conservar este património com as regras que foram criadas para esta área e com as parcerias dos municípios de Setúbal, Sesimbra e Palmela”, garantiu a responsável.

A brecha da Arrábida destaca-se foi explorada como rocha estrutural entre a Época Romana e o século XV, altura em que passou a ser utilizada como rocha ornamental associada ao estilo Manuelino no exterior de monumentos e, a partir do século XVII, no Barroco, sobretudo em aplicações interiores.

Em Setúbal, está presente em vários edifícios de elevado valor patrimonial, de que é exemplo maior o Convento de Jesus, mas também a Fortaleza de São Filipe, ambos classificados como Monumento Nacional, e a Casa do Corpo Santo.