Mestre Daniel Luz: “a viola campaniça não vai desparecer porque há muita gente interessada”

O mestre Daniel Inácio da Luz é um dos principais responsáveis pela preservação da arte de construção da viola campaniça, instrumento tradicional do Alentejo, em particular no concelho de Odemira, que em temos chegou-se a temer pelo seu desaparecimento face à falta de aprendizes.

O artesão é uma referência e uma figura carismática que vive intensamente o mundo da construção de cordofones. Fala da sua arte, das histórias de vida, dos tempos difíceis de conseguir gente nova para esta arte, mas atualmente é um otimista e garante que o ofício vai continuar e a viola campaniça até atrai artistas nacionais como o Tim da mítica banda portuguesa “Xutos & Pontapés”.

O jornal Setúbal Mais encontrou o mestre no pavilhão de artesanato, na companhia de um jovem aprendiz, na 31.ª edição da FACECO – Feira das Atividades Culturais e Económicas do Concelho de Odemira, que decorreu de 21 a 23 de julho, em São Teotónio, onde encantou o secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Carlos Miguel, e restantes visitantes com sua arte e sobretudo a forma cativante como fala desta tradição.

“Neste momento temos 13 alunos, alguns já saíram porque já acabaram a segunda formação e irei continuar se tive muita saúde”, afirma orgulhoso o mestre que recebe os formandos no seu atelier. Por ali formaram-se 30 pessoas provenientes de Odemira, São Martinho e São Teotónio.

“A viola campaniça esteve em risco de desaparecer no século passado, onde só já havia um mestre em São Martinho das Amoreiras, a construir” o instrumento, mas “em 1998 foi o ano em que decidi colocar os meus conhecimentos e prol da preservação da viola campaniça e pedi à Câmara Municipal de Odemira para ajudar a montar uma oficina, com ferramentas e algumas máquinas”.

“Neste momento, a viola campaniça não vai desparecer, de certeza absoluta, porque começou a formação e há muita gente interessada”, afirma o mestre, com orgulho, que explica e mostra detalhadamente as madeiras que são necessárias para a construção dos instrumentos e os segredos para obter o som perfeito.

Daniel Luz começou muito cedo na arte de construção de cordofones, na construção e reparação, foi conhecendo os tipos de madeira, para “a qualidade acústica do instrumento”, mas teve de trabalhar noutras áreas porque isto “não dava para viver”.

Com a passagem à reforma em 2004, “tenho trabalhado sempre a tempo inteiro na construção de vários instrumentos, mas com mais incidência na viola campaniça”.

Respeitante ao interesse cada vez mais crescente pela viola campaniça, o mestre considera que “deu um contributo”. Primeiro os mais velhos continuaram a tocar, mas apareceu o Pedro Mestre e Marco Vieira que começaram a ensinar e teve um efeito de “uma bola de neve”.

O artesão confessa que desde miúdo gosta de trabalhar a madeira. Quis seguir a carreira de carpinteiro com o seu pai, mas como não foi possível, ingressou numa oficina em São Teotónio, quando tinha 15 anos. Começou como aprendiz e acabou como mestre. Ao longo dos anos, nos tempos livres, foi aperfeiçoando a técnica na construção e reparação de diversos instrumentos. Só mais tarde, é que despertou o interesse pela viola campaniça, som que gostava de ouvir nas festas das aldeias, e na sua arte de construção.

Pela sua oficina, já reformado a tempo inteiro, construiu centenas de instrumentos como violas, guitarras, cavaquinhos, bandolins e claro a viola campaniça.

Em 2019, foi inaugurada uma oficina de construção de violas campaniças na sua terra e com o surgimento do Centro de Valorização da Viola Campaniça e do Cante de Improviso de São Martinho das Amoreiras. Escreveu o livro com o professor Manuel Vilela “As campaniças de Daniel Luz”, um manual a explicar as formas de construção, medidas, tipos de madeiras e ferramentas. Daniel Luz foi agraciado com a Medalha de Mérito do Município de Odemira pela sua atividade cívica e cultural, em 2018 e no ano seguinte pela Junta de Freguesia de São Teotónio.