Conhece Setúbal e o seu Rio Sado?

Por Rui Canas Gaspar

Cerca de 14 quilómetros é a distância que medeia entre Setúbal e a Gâmbia povoação que integra a Freguesia de Gâmbia, Pontes e Alto da Guerra, aquela que pertencendo ao concelho de Setúbal fica mais a nascente da cidade e que podemos considerar como a porta de saída para o Alentejo a partir da Estremadura, província onde se encontra inserida a cidade do rio azul.

A povoação fica localizada na margem direita do Sado onde lamacentos sapais formam canais por onde entram as pequenas embarcações de pesca que para conseguirem atracar valem-se de engenhosos cais palafitas construídos com mestria, ali junto ao antigo e desativado armazém que nos anos sessenta do século XX recebeu muitas toneladas de ostras do Sado.

Mas, é sobretudo no mês de março que os pescadores locais capturam os chocos que abundam por aquelas bandas e que depois são vendidos na lota de Setúbal, exceto aos sábados, domingos e feriados quando o fazem ali mesmo, junto ao seu improvisado porto de abrigo.

É nestas zonas de sapais do Sado que podemos observar explorações piscícolas onde se criam douradas, chocos, linguados e outras espécies, onde mesmo ao lado, nos terrenos lamacentos abundam as mais diferentes aves que se alimentam do que a natureza lhes oferece em tão fértil local.

É também nestas zonas lamacentas, repletas de vida que os esforçados mariscadores tentam governar a vida com o que o rio lhes proporciona, seja apanhando o isco para a pesca ou os bivalves que por ali abundam.

Curiosamente, já em terra firme, nos montados que se desenvolvem junto ao rio, quase às portas da cidade, pastoreiam grandes rebanhos de ovelhas bem como enormes manadas de gado bovino, tal como se já estivéssemos no Alentejo profundo.

Efetivamente Setúbal é um mundo por descobrir e para quem gosta de apreciar o seu belo rio azul, com os enormes cargueiros, os seus veleiros ou os seus pequenos barcos de pesca, subir o nosso rio uns poucos quilómetros é entrar em contacto com uma nova realidade.

E, se a meio caminho podemos deliciar-nos com a herdade da Mourisca, bonitinha, já meio virada para o turismo, vir até à Gâmbia e conversar um pouco com a sorridente e bem-disposta D. Manuela, sentada debaixo de um frondoso chaparro, antiga pescadora, apanhadora de ostras, trabalhadora nas salinas e nos vastos e verdejantes arrozais, não deixa de ser uma delícia.

Dar dois dedos de conversa com o artesão que aproveita este tempo de defeso para reparar o seu barco de fundo chato enquanto as armadilhas para apanhar os polvos ou os chocos se encontram empilhadas e arrumadas ali ao lado é um dos prazeres simples da vida que não se deve dispensar.

Setúbal é assim, bela, entre a serra e o rio, um rio que ao longo dos seus 180 quilómetros de extensão muita coisa ainda esconde e que eu estou na disposição de continuar a descobrir e a partilhar para que a memória não esqueça.

Por isso nada melhor que sair, bem cedo pela manhã, e fazer uma incursão Sado acima para assim poder observar aquilo que a natureza nos oferece e que o engenho humano potencializa ou desenvolveu ao longo de muitas gerações.