Entrevista com Augusto Pólvora, presidente da Câmara Municipal de Sesimbra: “A situação financeira da câmara é sólida, equilibrada e saudável”

O presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, Augusto Pólvora, que se encontra a exercer o seu último mandato, em entrevista ao jornal Setúbal Mais, aborda a situação financeira da autarquia que se encontra numa situação “estável e equilibrada”, dos investimentos previstos com o novo quadro de fundos comunitários, que podem atingir os 12 milhões de euros nos próximos anos, e do problema com o Estado na cedência dos imóveis do Cabo Espichel para a sua recuperação e usufruto da população.

Florindo Cardoso

 

Setúbal Mais – A requalificação do mercado de Sesimbra é uma obra emblemática. Qual o ponto da situação da empreitada?

Augusto Pólvora – Esta obra terá de estar concluída até ao final deste ano porque faz parte de uma candidatura ao PROMAR (Programa Operacional Pesca 2007-2013) que estabelece esse prazo para a sua execução financeira. Não foi um processo fácil porque o financiamento só foi garantido no final de 2014, sendo lançado, em tempo recorde, o procedimento administrativo e começada a obra em Maio. Foi um processo difícil de gerir porque obrigou a colocar os comerciantes dos produtos hortofrutícolas, pão, queijo e charcutaria, no largo do município, embora tenha criado uma situação original e positiva para o turismo, que foi de encontrar um mercado de rua. Obrigou ainda a gerir o mercado do peixe, sobre o qual estava centrada esta candidatura, passando da cave para a parte sul do edifício. Esta intervenção deu ao mercado do peixe maior visibilidade e melhores condições em termos de luminosidade e acolhimento. Todas as actividades foram concentradas no piso térreo, incluindo a venda de peixe, que ficou na parte sul do edifício. Na cave, vão ser instaladas uma câmara frigoríca a utilizar pelas bancas do peixe, frutas e legumes, e uma sala de formação equipada com cozinha. Serão ainda necessários pequenos trabalhos complementares a decorrer até Janeiro mas obra principal para o público está concluída. A requalificação do Mercado Municipal está enquadrada no Projecto de Valorização da Cultura Marítima e Piscatória de Sesimbra e aparece como elemento complementar do novo Museu do Mar, que está em fase de conclusão e abrirá ao público no início do próximo ano. As pessoas vão ao museu, situado na Fortaleza de Santiago, e serão estimuladas a visitar o mercado do peixe, onde podem ver ao vivo as várias espécies da nossa região, a forma como é tratado e confeccionado na referida cozinha.

S.M. – Este ano, a autarquia apostou nos balcões únicos de serviços para aproximar a autarquia aos munícipes. Como tem sido a reacção das pessoas?

A.P. – O Balcão Único de Serviços faz parte do nosso projecto de qualidade uma vez que Sesimbra tem uma certificação desde 2009 em todos os serviços municipais. Nos últimos anos foi identificado este projecto que se justificava de forma mais premente na vila de Sesimbra devido à dispersão física dos vários locais de serviços. O primeiro objectivo foi desde logo avançar em Janeiro deste ano com o Balcão Único de Serviços no edifício da Câmara Municipal que concentra todos os serviços, desde o pagamento das rendas e das facturas da água às senhas de refeições dos estudantes, excepto o Urbanismo, que funciona num imóvel ao lado. A concretização deste objectivo permitiu libertar espaços para o apoio ao funcionamento dos próprios serviços. O Balcão Único de Serviços também faz o tratamento das reclamações que chegam à autarquia. O primeiro embrião deste projecto foi instalado na vila e correu bem desde o início, com a vantagem de que se alargou o horário do atendimento ao público das 8 às 18.30 horas e aos sábados, das 8.30 às 13.30 horas, representando um ganho de cerca de 50 por cento em termos de tempo gasto para as pessoas tratarem dos seus assuntos. Recentemente, inaugurámos o Balcão Único da Quinta do Conde, no mesmo modelo, com a concentração dos vários serviços numa sala, com idêntico horário de atendimento. Além disso, entrou em funcionamento o Balcão Único Móvel, uma novidade e que não há muitos no país, que percorre toda a freguesia do Castelo, que representa 90 por cento do território do concelho com vários aglomerados urbanos dispersos, estando parado uma vez por semana em vários locais, fazendo três percursos por dia, incluindo ao sábado junto ao mercado de Lagoa de Albufeira, um sítio onde há muita segunda habitação. Este balcão móvel oferece exactamente os mesmos serviços dos fixos e para os assuntos que não puderem ali ser tratados é agendado com  o utente uma hora para atendimento na autarquia. Outra vantagem é que este balcão recebe também as reclamações dos munícipes, facilitando a sua resolução. Este projecto foi criado para alcançar grande proximidade para com os munícipes e está a correr muito bem até ao momento.

S.M. – Quais as grandes linhas do Orçamento municipal para 2016?

A.P. – O nosso orçamento para 2016 é semelhante ao do ano passado, com uma verba de 46 milhões de euros, com a diferença de que poderá subir mais 2 a 4 milhões de euros se entrarem alguns fundos comunitários de candidaturas apresentadas ao programa Portugal 2020. Algumas destas candidaturas estão já em pré-aprovação, inseridas no Pacto de Coesão Territorial e no PEDUS (Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano Sustentável), um investimento global na ordem dos 12 milhões de euros, incluindo a melhoria das condições pedonais, reabilitação dos bairros sociais, de alguns imóveis municipais degradados e a eficiência energética. À medida que as candidaturas forem aprovadas podemos inserir essas receitas no orçamento. Está também dependente da aprovação pela Assembleia Municipal de Sesimbra de um empréstimo de médio e longo prazo de valor equivalente à amortização do valor da dívida da autarquia de médio e longo prazo que se vence a curto prazo. O objectivo para 2016 é não agravar a dívida de médio e longo prazo e reduzir a ainda mais a dívida a curto prazo, que fechará este ano abaixo dos 6 milhões de euros. A situação financeira da câmara é sólida, equilibrada e saudável. A dívida global no final de 2015 deverá rondar os 25 milhões de euros, ou seja, metade da nossa capacidade de endividamento, na ordem os 50 milhões de euros.

S.M. – Quais os investimentos previstos?

A.P. – Para 2016 as repavimentações e as pavimentações de arruamentos de grande utilização pública que nos últimos anos se degradaram e devido às dificuldades financeiras que a câmara atravessou que não permitiram efectuar estas obras, nas freguesias do Castelo e de Santiago e na Quinta do Conde. Há ainda a aposta de pavimentar arruamentos que se encontram em terra batida, nomeadamente na freguesia do Castelo, que já podem avançar após as obras de infraestruturas básicas feitas no último mandato. Em termos globais, vamos investir mais de 1 milhão de euros. Nos projectos com apoios comunitários, vamos avançar com a construção da nova Escola Básica e Jardim-de-Infância da Quinta do Conde, na zona 2, com a particularidade de ter um auditório, com capacidade para 200 pessoas, para actividades culturais, e um campo de jogos com balneários, abertos à comunidade e a funcionar fora do horário escolar, dando resposta às necessidades da população da freguesia. Há também uma aposta grande na aquisição de maquinaria e equipamentos de apoio aos serviços municipais, nomeadamente na recolha de lixo e varredoura urbana, uma vez que a nossa frota não teve a renovação exigida, fruto das dificuldades financeiras. Na parte cultural, vamos avançar com a segunda fase da recuperação Casa da Água do Cabo Espichel, cujo concurso avançará no princípio de 2016, que abrange o seu restauro, complementando a obra do ano passado, em que requalificámos os muros, a antiga horta dos peregrinos, fontes e bebedouros para animais, o que permitiu realizar lá este ano a Feira do Mel com grande sucesso.  Destaco ainda a recuperação da Capela de S. Sebastião, o edifício mais antigo da vila de Sesimbra, junto ao cemitério de Santiago, que se encontra sem tecto, só com as fachadas, que foi objecto de uma candidatura a fundos comunitários.

S.M. – E a situação do Cabo Espichel?

A.P. – Continuamos sem fim à vista. Temos a possibilidade de avançar com uma obra no Santuário do Cabo Espichel, propriamente dito, nos espaços edificados, assim haja acordo final com a Direcção Geral do Tesouro e Finanças. Esta é uma história infeliz com vários episódios. Andámos três anos a trabalhar numa solução de permuta de terrenos entre a câmara e o Estado mas em Setembro, um mês antes das eleições legislativas, fomos informados de que não era possível, uma vez que os terrenos a permutar com o Ministério da Educação, de acordo com as regras do governo, teriam de ser pagos por este ao Ministério das Finanças. Voltámos a uma solução semelhante à Fortaleza de Santiago, ou seja uma cessão a favor da Câmara de Sesimbra por um determinado prazo mas existe um problema. É que, enquanto na Fortaleza de Santiago a cedência foi feita por um prazo de 87 anos, com a contrapartida da autarquia efectuar a reabilitação do imóvel, o que fez com sucesso, e a condicionante de 10 por cento da receita da renda da cafetaria ser entregue ao Estado, no Cabo Espichel apresentaram uma proposta completamente absurda em que a cessão é de apenas 30 anos. Quem vai investir milhões de euros de euros e devolver o imóvel neste prazo? E ainda mais, se a câmara fizesse o investimento total teria de entregar 25 por cento da exploração e se entregasse a um privado, subiria para 60 por cento. Nestas condições não é possível. A Câmara Municipal conseguiu uma verba de 500 mil euros de fundos comunitários no âmbito do Pacto de Coesão Territorial, para um investimento de 1 milhão de euros, numa primeira fase que poderia avançar agora. Nos últimos 20 anos, o Estado não tem feito nada, os únicos investimentos realizados foram da câmara. Não posso colocar em causa o património financeiro da autarquia para resolver um problema em que o Estado não está a agir como pessoa de bem. Recordo que inicialmente o Estado queria vender o edificado à câmara por 920 mil euros e desses, 420 mil euros era o valor da ala norte, e 500 mil euros para reabilitar a ala sul, um compromisso que o Estado tinha assumido com a igreja. Agora, reconhecem que só o valor do investimento a efectuar na ala sul, é de quase de 2 milhões euros. Ora, perante este valor, disse que poderiam doar o imóvel à câmara e faríamos as obras e as obrigações que o Estado tinha de reabilitar a ala sul e entregar à igreja. Estamos convencidos de que podemos entrar em negociações com um privado e a igreja e recuperar o Cabo Espichel. É este o desafio colocado. Estou a aguardar a resposta.

S.M. – Quais as expectativas com o novo governo?

A.P. – Espero que faça alguma diferença tendo em conta que o primeiro-ministro foi presidente de câmara, pondo fim a algumas injustiças a nível das finanças locais como por exemplo algumas receitas do Estado captadas pelos municípios possam ter reflexo nas transferências, a nível do IVA. No caso de Sesimbra, é muito importante porque tem muitos serviços e restauração e a receita acaba por não ficar na autarquia. Dos 5 milhões que recebemos das transferências do Estado, quase metade corresponde ao IRS dos residentes no concelho. Espero que seja revista a Lei das Finanças Locais a nível do IMT (Impostos Municipal de Transmissões Onerosa de Imóveis), que está prevista uma redução a partir de 2017 até à sua extinção. Espero que a lei seja revista, para que seja mantido o IMT, ou se encontre outra solução de financiamento. Quanto aos fundos comunitários, espero que haja mais facilidade dos municípios ao financiamento.