Municípios da região de Setúbal contra descentralização de competências do Estado central para as autarquias


O moroso processo de descentralização de competências do Estado central para as autarquias locais, que se arrasta há três anos, parece não convencer a maioria dos municípios do distrito de Setúbal por considerar que não é acompanhado de meios financeiros.

Dos 13 municípios, incluindo Alcochete, do PS, todos rejeitaram, com excepção de Almada, Sines e Montijo (socialistas), que ainda não anunciaram a sua decisão, a proposta do governo de transferir competências do Estado para as autarquias, por via dos decretos-lei sectoriais publicados em Novembro, em domínios como:

  • as vias de comunicação,
  • promoção turística,
  • justiça,
  • projectos financiados por fundos europeus e programas de captação de investimento,
  • apoio às equipas de intervenção permanente das associações de bombeiros voluntários,
  • gestão de Lojas e Espaços do Cidadão,
  • instituição e gestão dos Gabinetes de Apoio ao Emigrante e dos Centros Locais de Apoio e Integração de Migrantes,
  • habitação,
  • gestão do património imobiliário público sem utilização e
  • estacionamento público.

Recorde-se que a lei prevê que a transferência de competências ocorra de forma gradual e permite às autarquias optarem por adiar o exercício das novas competências, devendo comunicar a sua opção à Direcção Geral das Autarquias Locais (até 15 de Setembro de 2018, para as autarquias que não pretendiam a transferência em 2019, e até 30 de Junho de 2019, para as que não pretendam a transferência em 2020, considerando-se transferidas todas as competências a partir de 1 de Janeiro de 2021).

A Câmara Municipal de Palmela (CDU) argumenta a rejeição desta proposta com “o conjunto de implicações financeiras, humanas e organizacionais, a ausência de conhecimento sobre as matérias a transferir, as condições e as suas implicações”, exigindo que, “no domínio da transferência de novas competências, sejam identificadas as que se adequam ao nível municipal e não comprometem direitos e funções sociais do Estado e que as mesmas sejam acompanhadas dos meios financeiros adequados e não um mero pretexto para a desresponsabilização do Estado, por via de um subfinanciamento que o atual processo institucionaliza”.

A Câmara Municipal do Seixal (CDU) tomou a mesma posição. O presidente do município, Joaquim Santos, entende que “a ausência de conhecimento sobre as matérias a transferir, as condições e as suas implicações, que nem com a publicação de cada um dos onze decretos-lei se descortinam,  levam a que, responsavelmente, e na defesa dos interesses quer da autarquia quer da população, rejeitemos o modelo que o governo propôs e que a grande maioria das autarquias tem rejeitado, por todo o país”. O autarca acrescentou ainda que “o município considera que meios adequados e transparência do processo são componentes essenciais a um modelo de transferência de atribuições para as autarquias, que não consista apenas em transferir somente problemas e descontentamentos, transformando uma descentralização numa desresponsabilização”.

O município da Moita (CDU) reafirma a mesma posição, considerando que “a transferência de novas competências não deve comprometer direitos e funções sociais do Estado (designadamente a sua universalidade) e deve ser acompanhada dos meios financeiros adequados e não ser pretexto para a desresponsabilização do Estado, por via de um subfinanciamento que o atual processo institucionaliza”.

Também a Câmara Municipal de Setúbal (CDU) decidiu não aceitar a transferência de competências da Administração Central em 2019 porque entende que está em causa “a consagração do subfinanciamento do poder local e a transferência de encargos em áreas e domínios vários, colocando novos e sérios problemas à gestão das autarquias e, sobretudo, à resposta aos problemas das populações”. A deliberação camarária sublinha que, “além da insuficiência ou completa indefinição dos necessários meios técnicos e financeiros, em praticamente todos os domínios apenas são transferidas para as autarquias competências de mera execução, o que as coloca numa situação semelhante à de extensões dos órgãos do Poder Local e multiplica as situações de tutela à revelia da Constituição, contribuindo para corroer a autonomia do Poder Local”.

Municípios do Litoral Alentejano rejeitam competências

Os municípios do Litoral Alentejano também rejeitam a transferência de competências pretendida pelo governo. Alcácer do Sal, Grândola e Santiago do Cacém, todas da CDU, já se manifestaram contra. A autarquia de Sines, PS, ainda não tomou posição.

A Câmara de Alcácer do Sal (CDU) decidiu rejeitar a transferência de competências do Estado para as autarquias “em 2019 e 2020”, alegando “falta de clareza dos aspectos financeiros e organizacionais” dos diplomas. “O grande fundamento para a rejeição desta proposta por parte da câmara municipal é a falta de clareza dos aspectos financeiros e organizacionais dos diplomas”, refere o município. A autarquia alertou ainda para “o facto de o fundo de financiamento da descentralização, único elemento legal habilitante para transferência de verbas para esta delegação de poderes, não ter qualquer dotação financeira no Orçamento do Estado para 2019”.

Também a Câmara Municipal de Santiago do Cacém (CDU) decidiu rejeitar as competências que o Estado quer transferir para as autarquias locais em 2019 e 2020, porque não há qualquer garantia legal de virem acompanhadas de meios financeiros. O presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém, Álvaro Beijinha, argumenta que a apreciação geral sobre o processo, o conjunto de implicações financeiras, humanas e organizacionais, a ausência de conhecimento sobre as matérias a transferir, as condições e as suas implicações, só descortináveis com a publicação de cada um dos Decretos-Lei, “por estas razões o município responsavelmente e na defesa dos interesses quer da autarquia quer da população rejeita a assunção, a partir de 1 de Janeiro de 2019, das novas competências”.

O município de Grândola (CDU) reafirma a rejeição da transferência de competências do Estado em 2019 e em 2020, das competências da administração central previstas nos decretos-lei sectoriais já publicados. O município considera que a Lei das Finanças Locais e a Lei da Transferência de Competências para as autarquias, aprovadas no final da sessão legislativa, confirmam a consagração do subfinanciamento do poder local e a transferência de encargos em áreas e domínios vários, colocando novos e sérios problemas à gestão das autarquias e, sobretudo, à resposta aos problemas das populações, reafirmando que, só com meios adequados e transparência no processo é possível garantir um real e adequado modelo de transferência de competências para as autarquias locais.