Categories: Opinião

Saudades da Tróia de outros tempos

As famosas praias da península de Tróia fazem parte da minha vida bem como de milhares de setubalenses e gentes da região que, desde a infância, se habituaram a passar as férias de Verão naquelas areias paradisíacas ou, simplesmente, a dar um passeio à beira-mar aos fins-de-semana e noutras ocasiões, sempre que o bom tempo permitisse.

Ir a Tróia, aqui tão perto, a poucos minutos de barco, permitia encontrar sensações de paz e liberdade junto do extenso areal, branco e limpo, por pouquíssimos escudos. Os velhinhos barcos, que diga-se em abono da verdade já se encontravam bastante degradados, era o que menos importava perante um cenário tão belo que nos rodeava e, sobretudo, a um preço muito acessível para as famílias. Daí o nome de “praia do povo”.

Não sou daqueles saudosistas que só vivem do passado e contra a modernidade, mas não posso esquecer os bons tempos passados em Tróia com a  família e os amigos, sempre que se aproximava o Verão. Com pouco mais de um euro, o povo fazia a festa. O preço da última travessia, ida e volta, em 2005, ainda na antiga Transado, era apenas 1,80 euros.

Era uma festa, com centenas de crianças a brincar no areal ao lado dos pais, dezenas de famílias a fazerem piqueniques debaixo das árvores e vegetação junto à praia, onde hoje está a marina e o hotel casino. Na hora de almoço, uma escapadela até à esplanada e visitar as lojinhas. Uma romaria de gente que desfrutava da praia e do ambiente envolvente de forma saudável e alegre.

Nos últimos onze anos Tróia deixou de ser a praia do povo mas um resort de luxo, construído a pensar nas classes médias e altas, sobretudo turistas da Europa Central e do Norte, abastados e com vontade de viver em climas amenos, como já acontece no Algarve. Sonhava-se com a entrada de milhões de euros, projectava-se já um novo destino turístico alternativo ao Algarve. Em nome do desenvolvimento turístico permitiu-se tudo, afastou-se o cais dos ferries para a zona dos fuzileiros, a quilómetros do centro, e vedou-se a praia para permitir a venda de lotes de terreno para construção de moradias e de unidades hoteleiras.

Actualmente, quem quiser visitar Tróia, a partir de Setúbal e utilizando para o efeito o catamarã da Atlantic Ferries, paga 6,55 euros (mais 0,50 cêntimos pelo cartão Viva Viagem que tem a duração de um ano). Um casal com uma criança (entre os 5 e 10 anos paga 4,40 euros) terá de desembolsar 17,50 euros apenas para o trajecto de ida e volta. Para o percurso nos ferries uma viatura ligeira com condutor paga 14,75 euros (ida e volta 29,50 euros). Por cada adulto que segue na viatura paga-se 3.45 euros.

Podem dizer que as embarcações são de óptima qualidade porque é verdade, que a viagem é confortável e rápida também é, mas tornou-se incomportável em termos de custo para os tempos que vivemos.

Basta dar um passeio por Tróia, mesmo nos tempos de maior calor, para ver a diminuição drástica de banhistas. Pouca gente em comparação com os milhares de há uns anos.

Não tenhamos dúvidas que condicionamos o acesso das pessoas aos locais pelo preço. Não é proibido ir a Tróia, não está lá nenhuma placa a informar que não queremos aqui os setubalenses. Só que é proibido para a carteira dos mais pobres e de uma classe média que com os impostos a pagar ao Estado está na rua da amargura.

Ir a Tróia e ver quase tudo fechado, apenas com três restaurantes, um café e uma geladaria a funcionarem e uma dezena de lojas vazias pergunta-se onde está o sucesso deste projecto turístico.

Não seria caso para questionar os responsáveis se não teria mais lógica baixar o preço dos bilhetes dos barcos e com isso atrair milhares de pessoas que consumiam na restauração e nas lojas. Além disso, o casino não estaria às “moscas” como acontece, com excepção dos dias de espectáculos.

Um pouco de história: a construção da Torralta começou em 1970 com o objectivo de criar 70 mil camas para a classe média. Em 1984, surgiram os primeiros problemas financeiros a colocar o projecto em risco. Dez anos depois, é declarada falida, com dívidas de 150 milhões de euros. Em 1998, a Sonae Turismo, de Belmiro de Azevedo, decide comprar a Torralta mas só dois anos depois foi aprovado o plano de urbanização. Em 2005, a Atlantic Ferries assume a concessão para a travessia fluvial do Sado, pelo prazo de 15 anos. Só em 2005 começam as obras de requalificação, com a demolição de 2 torres inacabadas. O empreendimento turístico é inaugurado a 8 de Setembro de 2008, um investimento de 450 milhões de euros. Em 2011, abre o Casino de Tróia.

 

 

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