Imigrantes: Câmara de Odemira pede intervenção urgente do governo

O concelho de Odemira tem registado nos últimos anos um crescimento significativo de imigrantes asiáticos e do Leste Europeu para trabalhar na agricultura, sobretudo nas estufas. Há localidades e ruas onde a maioria dos habitantes já são estrangeiros. Perante a escalada galopante, sobretudo na freguesia de S. Teotónio, o presidente do município, José Alberto Guerreiro, pede a intervenção urgente do governo.

Florindo Cardoso

O presidente da Câmara Municipal de Odemira, José Alberto Guerreiro, manifesta-se preocupado com o elevado número de imigrantes asiáticos no concelho, causando já alguns sinais de alerta e mau estar nas populações e exige ao governo que “tome medidas” porque “não há capacidade para continuar a entrar em Odemira, a este ritmo, cidadãos, cuja origem desconhecemos”.

José Alberto Guerreiro, presidente da Câmara Municipal de Odemira

“Encaramos com preocupação esta situação porque alguns vêm à procura de melhores condições de vida, trabalhar sobretudo no sector agrícola, embora haja outros noutros serviços, mas há muitos que os vimos por cá continuamente”, disse o edil ao jornal Setúbal Mais, questionado sobre esta problemática, destacando que “este processo de modelo de legalização de imigrantes passa completamente à margem das câmaras municipais”.

José Alberto Guerreiro sublinhou que “temos a sensação de que a pretexto da actividade agrícola também há muita gente a entrar por via de empresas contratantes de mão-de-obra, que estão a tratar de processos de legalização e a isto não estará alheio a alteração da lei em Abril de 2019, aprovada na Assembleia da República”, adiantando que “a partir daí notou-se muito mais esta situação”.

“A lei permite que quem cá está ilegal, esteja onde estiver, ou que chegue cá de forma ilegal, que possa legalizar-se com um processo muito mais simplificado”, denuncia o autarca alentejano, adiantando que “parece que Portugal é o país da Europa com maior facilidade nesta matéria, sendo elogiado por uns e criticado por outros”.

“Há preocupação de alguns estejam a entrar para trabalhar neste concelho mas para ir para outras paragens, que desconhecemos, e temos dado conta ao governo desta nossa preocupação e exigimos maior controlo nesta situação, e obviamente não pode continuar indeterminada esta realidade”, disse ainda o autarca.

“De um momento para o outro, não é só a imagem de muita gente estrangeira nas ruas mas também a dúvida se são pessoas que vêm para bem ou se têm outro propósito”, adverte o presidente do município de Odemira, admitindo que isto “altera um pouco a tranquilidade das pessoas e o seu modo de vida”.

“Vivem cerca de 16 mil pessoas na vila de Odemira e tendo em conta que os números são de 6 a 8 mil de estrangeiros, nos períodos de colheita, estamos a atingir o máximo de razoável para tanto curto espaço de tempo, estamos no limite”, alerta o autarca, garantido que “esta denúncia não é contra a multiculturalidade, sempre fomos um concelho com população estrangeira, mas esta é uma realidade nova, com outros contextos, religiosos e sociais que merecem alguma reflexão”.

José Alberto Guerreiro revelou que os números oficiais relativos a Junho de 2019 do Centro Local de Atendimento e Legalização de Imigrantes, apontam para a existência de mais de 8 mil cidadãos estrangeiros oficializados, dos quais 6 mil estão no concelho de Odemira. Já o Serviço Especial de Fronteiras (SEF), divulgou que em Dezembro de 2018, que o concelho de Odemira tem 56% de imigrantes legalizados do distrito de Beja.

“As autoridades terão de responder ao número dos que não estão legalizados porque já fizemos essa denúncia e terão de actuar com uma posição mais firme”, assegura o autarca.

“Qualquer especulação feita com outros números ultrapassa o conhecimento da câmara municipal”, acrescenta.

Questionado sobre os efeitos do crescimento populacional de estrangeiros no concelho sobre as infraestruturas básicas como o saneamento e abastecimento de água, José Alberto Guerreiro, assegura “os nossos aglomerados têm capacidade de resposta”, uma vez que também já contam com o aumento de fluxo de turistas durante o Verão.

O autarca admite o problema de acumulação de resíduos na via pública porque “estamos com dificuldades, quer tivéssemos mais população ou não, na contratação de efectivos para trabalhar neste sector, os concursos ficam desertos”. Há maquinaria suficiente, o problema está na falta de mã-de-obra porque há emprego mais atractivo noutras áreas.

Uma terra multicultural

Basta dar um passeio pelas ruas da vila de Odemira para aperceber-se deste novo fenómeno. A maioria das pessoas que circula pelas ruas, vagueiam com telemóveis, em video-chamadas, em língua imperceptível, pelo menos para os portugueses. Não interagem com a população mas nota-se um desconforto na população local.

Vista geral da vila de Odemira

São nepaleses, indianos, paquistaneses e tailandeses, na sua maioria, uns com turbantes coloridos, barba, de sandálias e com calças de ganga, outros já numa mistura entre o ocidental e oriental. O facto é passam despercebidos porque falam muito alto, não se preocupam com quem está o lado e não frequentam os sítios dos portugueses. Preferem as barbearias e os pequenos negócios em funcionamento na vila. Os cheiros aromáticos nessas ruas são uma constante a contrastar com a arquitectura e os hábitos locais.

Em conversas com a população local, que falam sobre este assunto mas sempre com reservas, apercebe-se do mau estar patente. Há uma “neblina” social que paira sobre o céu de Odemira. Todos sabem do assunto mas há um certo receio. Fala-se à “boca fechada” mas começa a notar-se um certo medo.

Nas ruas, grande parte da população anda a fazer as suas compras, em lojas ainda antiquadas, onde ainda se vende à medida, e nos bancos de jardins alguns velhotes metem a conversa em dia.

A vila tem cada vez mais alojamentos locais. Para espanto de algumas pessoas, o que poderia ser para receber turistas, tal não acontece. As unidade hoteleiras, na sua maioria residências a lembrar os anos oitenta, sem muitas melhorias, e com estabelecimentos comerciais no rés-do-chão, porque são negócios familiares, acabam por receber estes imigrantes, alguns com reservas feitas pelos patrões.

Outros casos há, de apartamentos com dezenas de pessoas a habitar no mesmo espaço, criando problemas para os vizinhos, já que os hábitos sociais, a língua e religião são muitos diferentes. Há casos de um T2 com uma dezena de pessoas a residir.

A falta de habitação é um dos problemas maiores deste concelho e a elevada procura está a inflacionar os preços das casas quer para venda quer para arrendamento.

S. Teotónio já tem mais imigrantes que residentes

S. Teotónio, do ponto de vista económico, é das freguesias mais ricas e produtivas, sendo as suas principais actividades a pequena indústria, agricultura, pesca, produção florestal, comércio e turismo.

Dário Guerreiro, presidente da Junta de Freguesia de S. Teotónio

Com 6.439 habitantes, segundo dados do Instituto Nacional de Estática (Censos 2011) é a que a sofre mais com este fenómeno da imigração. Segundo o presidente da Junta de Freguesia, Dário Guerreiro, entre Abril de 2017 e Junho de 2019, foram emitidos cerca de 8 mil atestados de residência a cidadãos estrangeiros, fora do espaço europeu. O autarca reconhece alguns problemas sobretudo na recolha de lixo.

Por falta de mão-de-obra local para trabalhar na agricultura, entre 2014 e 2018, esta população não europeia, passou de 3.500, na sua maioria do Nepal, Índia, Tailândia e Bulgária, para 11 mil.

No Agrupamento de Escolas de S. Teotónio, 40% dos 700 alunos, são estramgeiros, de 25 nacionalidades, levando a que fosse criada uma disciplina extra de ensino de português.

Projectos de integração  dos imigrantes

A Câmara Municipal de Odemira é um exemplo na criação de programas de integração social de imigrantes porque sempre foi um concelho procurado por estrangeiros para residir.

Câmara de Odemira aposta na integração dos imigrantes

Neste momento está implementado o projecto “Odemira Integra + ” – Plano Municipal para a Integração de Migrantes  que encontra-se na segunda fase de execução, com financiamento garantido até Agosto de 2020 com 32 medidas, em 13 áreas de intervenção.

O objetivo geral é construir e implementar um plano assente na participação de toda a comunidade, capaz de acolher e integrar os migrantes nacionais de países terceiros numa perspetiva de diferenciação com enriquecimento cultural, social e económico e, simultaneamente, integrar e dar continuidade a projectos, estratégias e intervenções iniciadas no âmbito da implementação do primeiro plano.

O Plano Municipal para a Integração de Migrantes foi concebido tendo em consideração aprendizagem que o anterior plano nos proporcionou, os novos dados recolhidos para melhor reconhecer a realidade migrante no território e voltando a contar com a participação/colaboração/compromisso das entidades e dos próprios migrantes. Assim, apresenta-se neste documento a dimensão estratégica e operacional revista e avaliada, permitindo a continuação deste trabalho em prol do bem-estar, da segurança e da identidade cultural de todos os que partilham e convivem no território do concelho de Odemira.

Nestes pressupostos, a Comissão Local para a Interculturalidade considerou como prioritárias as seguintes áreas de intervenção: Serviços de Acolhimento e Integração, Urbanismo e Habitação, Mercado de Trabalho e Empreendedorismo, Educação e Língua, Saúde, Solidariedade e Resposta Social, Cidadania e Participação Cívica, Media e Sensibilização da Opinião Pública, Racismo e Discriminação, Religião.

Plano Municipal para a Integração de Migrantes, ou seja, aquelas relativamente às quais os parceiros locais definiram, em sede da Comissão Local para a Interculturalidade, que não teriam recursos para as executar e que, como tal, teriam de recorrer a financiamento externo.

São estas: Capacitar os funcionários/técnicos dos serviços públicos que realizam atendimento nos serviços públicos; Traduzir, imprimir o “Kit de Acolhimento ao Cidadão Migrante em Odemira”; Assegurar respostas de proximidade aos problemas específicos apresentados pelos cidadãos NPT (CLAIM); Comemoração do Dia da Interculturalidade; Informar os cidadãos migrantes sobre os direitos/deveres em situação de arrendatários. (Traduzir em 3 línguas, imprimir e distribuir flyer); Tradução (em 3 línguas, impressão e distribuição de materiais de informação sobre “Apoio a Melhorias Habitacionais” e “Apoio ao Arrendamento”; Elaboração, tradução e divulgação do Guião de Acolhimento ao Aluno e ao Encarregado de Educação Migrante”; Traduzir, publicar e divulgar, junto da população migrante, brochura informativa relativa ao funcionamento do SNS, garantindo um nível de informação essencial para o acesso aos serviços de saúde.