O milagre de Salvador Sobral

Portugal viveu momentos felizes e épicos, coisa rara e difícil de acreditar porque a 13 de Maio aconteceram vários milagres.

Depois de anos de crise, em que a palavra austeridade era a que mais se ouvia, com os governantes a fazerem fé no empobrecimento do país, parece que se deu o milagre de Fátima, cem anos depois e o povo ficou embriagado de tanta felicidade.
Em apenas num sábado deu-se a trilogia dos 3 efes – Fátima, Futebol e Festival. É obra! O coração dos portugueses não aguenta tanta notícia boa.
Vamos por partes, o papa Francisco conseguiu atrair mais de um milhão de pessoas ao santuário de Fátima, que assistiu à canonização dos pastorinhos Jacinta e Francisco. Os crentes em Nossa Senhora de Fátima rejubilaram com esta cerimónia que assinalou também o centenário das aparições na Cova de Iria. Foi lindo assistir uma multidão a erguer lenços brancos na passagem de Nossa Senhora pelo recinto do santuário. Mesmo para os não crentes há que dizer que é impressionante o número de pessoas que esteve em Fátima em redor de um grande homem, Francisco, que pela sua simplicidade e despojamento, merece a admiração de muitos portugueses. Este papa que rezou por nós, é um exemplo a seguir por muitos de nós. Fazer o bem ao outro já começa a ser raro com esta sociedade egocêntrica e cada vez mais individualista.
Depois do papa partir rumo ao Vaticano, começou a festa dos benfiquistas. Dizem as estatísticas que são seis milhões. O facto que muitos milhares rumaram ao Marquês de Pombal para festejar o tetra no campeonato nacional de futebol. A festa foi bonita, sem problemas e até houve tempo para ouvir o Salvador Sobral a cantar no Festival da Eurovisão.
Pois é, este ano, Portugal ganhou o Festival da Eurovisão, 53 anos após a primeira participação com “Oração”, de António Calvário. Foi em 1964 e conseguimos zero pontos. Depois passaram por lá tantos artistas de uma imensa qualidade, desde Simone Oliveira, Paulo Carvalho, Carlos Mendes, até à Dulce Pontes, Anabela, Lúcia Moniz e José Cid. O resultando era sempre o mesmo: uma grande decepção, tristeza e revolta que levou ao afastamento do povo do Festival da Canção. Sinceramente nem recordo de quem passou por lá nos últimos anos. Foi de mal a pior.
Este ano, a RTP inovou na selecção das canções, convidando novos compositores, entre os quais Luísa Sobral que apresentou “Amar pelos dois”, cantada pelo seu irmão Salvador Sobral. Uma melodia maravilhosa que não agradou a todos no Festival da Canção e até não foi a mais votada pelo povo, sendo salva pelo voto do júri. De Salvador Sobral, disseram tudo, desde anormal a doente, um rol de ofensas. Mesmo assim, o “nosso” Salvador, indiferente a tudo porque só lhe interessa a música, partiu para Kiev à conquista da Europa.
A canção foi ganhando vida própria no estrangeiro e com elogios de grandes nomes da música portuguesa e até de Caetano Veloso, um dos maiores artistas do Brasil. O facto é que na noite de 13 de Maio, aconteceu algo inédito, ganhámos pelo voto do júri e do público, atingindo 758 votos, a maior votação de sempre.
O Salvador Sobral, com aquele ar frágil e um pouco “fora da caixa” como costuma dizer, deu-nos a nós e à Europa, a cantar em português, um dos melhores momentos musicais já mais vistos naquela máquina de horrores televisivos.

Obrigado Salvador Sobral pela felicidade que senti naquele momento em que foi anunciada a vitória de Portugal na Eurovisão.
Continuando na senda de boas notícias no passado dia 22 de Maio a Comissão Europeia retirou Portugal da lista negra dos défices excessivos. O povo que já sofreu tanto nos últimos anos agradece.