Na minha vida tento sempre praticar a tolerância

Entrevista a Rita Ribeiro, actriz:

 

 

O monólogo Gisberta, de Eduardo Gaspar, com a actriz Rita Ribeiro, vai ser apresentado no próximo dia 17, às 21h30, no Cinema-Teatro Joaquim D’Almeida, no Montijo, data em que se assinala o Dia Internacional contra a Homofobia. O semanário Setúbal Mais aproveitou a ocasião para ouvir a protagonista desta peça, que teve estreia em Outubro passado no Funchal, e que mostra o relato do hediondo assassinato da transexual do Porto.

 

Luís Geirinhas

 

Semanário Setúbal Mais – Como está a ser esta experiência de encarnar o papel de mãe da Gisberta?

Rita Ribeiro – Em primeiro lugar estou muito agradecida por ter aparecido este projecto, é um dos mais importantes da minha vida. É um espectáculo que não é apenas teatro, mas que tem também uma intervenção social e isso faz-me sentir bastante realizada, não só como actriz mas também como ser humano. Tem sido uma experiência muito diferente, sai da minha zona de conforto, desde Maio do ano passado, mas na realidade foi algo que acabou por ser extraordinário e foi uma experiência de enorme satisfação e realização profissional. Pensamos que este espectáculo, infelizmente, é muito actual e fala de muitas coisas que hoje em dia ainda se passam e por isso achámos que o Gisberta devia continuar a existir e a fazer passar essa mensagem, porque o espectáculo acaba por ser um veículo de um enorme desbloqueio emocional e ninguém fica indiferente quando vê a história. Ficamos com a consciência de como uma coisa destas pode abranger todas as pessoas que nos rodeiam. O espectáculo fala, acima de tudo, do amor incondicional.

 

S.S.M. – Como vê o assassinato desta transexual e as agressões de que foi alvo?

R.R. – Esse triste episódio serve para falarmos de muitas outras coisas. É evidente que acontecimentos como esse são terríveis e não há palavras que classifiquem, mas de alguma forma acho que o Eduardo Gaspar, utilizando e ficcionando a história, na percepção da história de uma mãe, não deixa de ser poético e belo. É um episódio terrível para se falar de variadíssimas coisas da nossa sociedade. A peça não fala só nisso, o episódio serve de gatilho para se falar de muito mais coisas.

 

S.S.M. – Na digressão desta peça por várias cidades qual tem sido a recção do público?

R.R. – Tem sido espectacular, tem tido um feedback fantástico e espectáculos com uma conversa ou palestra a seguir tornam-se em algo muito construtivo, porque depois debate-se um pouco as dúvidas de cada um. De todos os públicos aquele que foi o mais receptivo, como é natural, foi precisamente o do Porto.

 

S.S.M. – Este é um espectáculo que de certa forma denuncia os preconceitos ainda existentes na sociedade. Como encara a falta de tolerância?

R.R. – Regra geral, não costumo fazer julgamentos de ninguém, na minha vida tento sempre praticar a tolerância, a flexibilidade e a aceitação, e é isso que faço através deste espectáculo, tentando mostrar um pouco sobre outros caminhos, abrindo outras portas e outras percepções da vida.

 

S.S.M. – Uma primeira montagem de 15 minutos originou a versão actual da peça. O que mudou nesta representação?

R.R. – Não mudou muito. Quando chegámos à conclusão que o espectáculo tinha que continuar a viver, ficámos muito apaixonados pelo projecto e achámos que tinha que continuar e o Eduardo Gaspar, muito sabiamente, construiu um texto de 15 minutos num texto de uma hora, em que acho que é mais dedicado talvez às causas que levam a certas consequências, portanto talvez seja mais detalhada a infância de Gisberta e o relacionamento que a mãe tem com Gisberta.

 

S.S.M. – Além deste trabalho, por onde podemos encontrar Rita Ribeiro nos próximos tempos?

R.R. – Vou fazer ainda este espectáculo em Lisboa, no São Jorge, nos meses de Julho e Agosto, porque ainda não foi feita esta versão de uma hora, e vou continuar em digressão com ele, por isso existirá enquanto o público quiser e vai ficar sempre em carteira. Hoje em dia estou com outro projecto entre mãos, não posso falar muito dele, mas passa pela música. Vou dedicar-me um pouco mais à minha outra faceta, no fundo com que eu me estreei aos 17 anos, e à qual estou a retornar. É um ciclo a que estava com muita vontade de voltar.

 

S.S.M. – Continua a ser difícil fazer teatro em Portugal?

R.R. – É muito gostoso, porque faço aquilo de que gosto. Temos que nos saber adaptar ao que estamos a viver e sempre fiz isso na minha vida. É preciso ter muita vontade, sermos muito determinados e há sempre portas que se podem abrir. É preciso é ter realmente muita vontade e confiança, porque todos sabemos que esta é uma profissão que não é muito amparada pelo Governo. No outro dia, perguntaram-me o que senti quando me nomearam para os Globos e pensei que ter feito este espectáculo já é um presente muito grande que a vida me deu!

 

CAIXA

 

Retrato

FOTO: DR

Em teatro, Rita Ribeiro trabalhou durante vários anos como atriz convidada da Companhia de Filipe La Féria, tendo atuado nos espectáculos “Master Class”, onde interpretou Maria Callas tendo recebido todos os prémios de teatro como melhor atriz; A “Gaiola das Loucas”; “Um Violino no Telhado”; “A Flor do Cacto”; “A Rosa Tatuada”; “Maldita Cocaína”; “Passa por mim no Rossio”; e “What Happened to Madalena Iglésias”. Com a sua própria companhia de teatro, produziu o espectáculo em homenagem ao seu pai “Concerto para Dois – Fernando Curado Ribeiro – O último Galã”; “Amar Amália”; e “Aqui há Fantasmas”.

Actuou ainda em diversas produções como “Ai quem me Acode”; “Godspell”; “Annie”; “Ó Patego, Olha o Balão”; “Rei, Capitão, Soldado e Ladrão”; “Felizardo e Companhia; Desculpa, ó Caetano”; “Em Part-Time”; entre outros. Em Televisão actuou em várias telenovelas, entre as quais “Doida por Ti”; “Fúria de Viver”; “Na Paz dos Anjos”; “Palavras Cruzadas”; e em seriados como “Os Batanetes” ou “Por favor não matem a minha mulher”; e comédias de Ouro: “Todos ao Palco” e “A mulher do Senhor Ministro”. Ainda em televisão, participou numa infinidade de programas de entretenimento, telefilmes e musicais. No cinema trabalhou nas longa-metragens “Querido Lilás” de Artur Semedo e “Saudades para dona Genciana”, de Eduardo Geada. Mantém uma actividade constante como cantora, apresentando-se em casas de fado e teatros, não só em Portugal, como também no estrangeiro.