Fundação Buehler-Brockhaus oferece “golfinhos” a Setúbal

A peça escultórica dos golfinhos em mármore alentejano foi oferecida à cidade pela Fundação Buehler-Brockhaus, constituída por um casal alemão de mecenas, que se apaixonou por Setúbal. É a quinta obra de arte pública oferecida à cidade, sendo esta a mais emblemática.

 

Florindo Cardoso

A Fundação Buehler-Brockhaus ofereceu à cidade a peça escultórica dos golfinhos, esculpidos em dez blocos de mármore do Alentejo, da autoria de Carlos Andrade, instalada na principal rotunda de entrada na cidade através da A12. A cerimónia de inauguração teve lugar ao final da tarde da passada quinta-feira, 29 de Junho, contando com a presença dos responsáveis da fundação constituída por Marion Buehler-Brockhaus e o marido, Hans-Peter Buehler, casal alemão que se apaixonou por Setúbal, do escultor Carlos Andrade e da presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Maria das Dores Meira, que descerram uma placa alusiva à efeméride.

 

A autarca sadina agradeceu ao casal de mecenas, frisando que “não há palavras suficientemente fortes para expressar a gratidão que sentimos”. “É uma honra tê-los como cidadãos de Setúbal, uma alegria saber que se sentem setubalenses de corpo inteiro e que a vossa marca perdurará nesta pedra branca por muitos anos”, salientou Maria das Dores Meira.

Esta peça escultórica é a quinta obra doada à cidade pela Fundação Buehler-Brockhaus nos últimos cinco anos, no âmbito de um protocolo de colaboração celebrado com a Câmara Municipal de Setúbal. A primeira foi em 2012 com três figuras evocativas de profissões no Mercado do Livramento da autoria do cartoonista e escultor Augusto Cid (talhante, vendedor de flores, ovos e galinhas e carregador de peixe). No mesmo ano, ofereceram o conjunto escultórico no exterior no Fórum Luísa Todi, e da escultura “Zéfiro”, na rotunda do Monte Belo Norte (2013), ambos do escultor Sérgio Vicente Lisboa. A quarta foram as “Sardinhas”, de Luísa Pirienes, escultora setubalense, na rotunda das Fontainhas, em 2015.

“Soubemos que a senhora presidente da câmara procurava uma escultura emblemática para instalar nesta rotunda no final da A12, e apaixonámo-nos pela ideia de doar a quinta peça de arte à cidade”, explicou Marion Buehler-Brockhaus, adiantando que em Fevereiro de 2015, levaram a presidente da autarquia a conhecer os primeiros esboços da peça que Carlos Andrade e “foi logo tomada a decisão de instalar os golfinhos na rotunda mais emblemática da cidade”.

“Estamos orgulhosos de sermos setubalenses, não de cara mas de coração, e esperamos que os golfinhos alegrem os setubalenses e todos os nossos visitantes”, disse Marion Buehler-Brockhaus.

Para a concepção da peça, foram escolhidos dez blocos de mármore de Estremoz, “o ouro branco do Alentejo”, segundo a mecenas, com o peso inicial de 300 toneladas, levados para uma pedreira em Sintra, que serviu de local de trabalho para Carlos Andrade ao longo de vários meses.

Para Carlos Andrade, os golfinhos do Sado, uma das três comunidades sedentárias em todo o mundo, são “a singularidade de Setúbal”, e, por isso, esta peça “não é uma obra de decoração de uma rotunda qualquer”, mas, sim, “de arte pública” que merece “reflexão de toda a gente”.


Entrevista com Carlos Andrade, escultor:

“Esta obra foi feita para materializar a alma do povo de Setúbal”

 Carlos Andrade nasceu em 1968 em Lisboa. Em 1990 licenciou-se em História da arte pela Universidade Autónoma de Lisboa. Posteriormente tirou um curso de conservação e restauro de escultura participando em alguns projectos, destacando-se a sua colaboração na equipa de restauro no claustro dos Jerónimos. Tem arte pública exposta em cidades como Loures, Cantanhede, Grândola, Sangalhos, Belmonte, Ericeira, Açores e Porto de Mós. Esta é a sua obra de maior dimensão no país.

 

Setúbal Mais – Foi difícil a concepção desta obra?

Carlos Andrade – Foi como fazer uma daquelas ondas gigantes da Nazaré, mesmo para quem saiba surfar logo no início.

S.M. – Gostou do trabalho final?

C.A. – Sim. Tinha a expectativa que isso fosse acontecer. Quando partimos para um projecto destes, é quase como arquitectura, temos de perceber o tamanho que vai ocupar no espaço, as dimensões, e o que está à volta.

S.M. – Os golfinhos são uma referência em Setúbal. Foi uma ideia logo estabelecida?

C.A. – É a singularidade de Setúbal. Aqui o artista não tem um projecto pessoal. Existem três comunidades de golfinhos pelo mundo inteiro e Setúbal tem uma delas. Esta peça tem esta singularidade e um local próprio na cidade e no mundo. Esta obra foi feita para materializar a alma do povo de Setúbal. Esta obra não é uma decoração, não caiu de paraquedas na rotunda, foi escolhido o local de entrada na cidade. Que este monumento seja um ponto de reflexão para toda a gente, como vamos conseguir perpetuar a presença dos golfinhos junto de nós.

S.M. – Costuma trabalhar com peças de grandes dimensões?

C.A. – Como esta não. Esta foi a maior que fiz. Foram 300 toneladas no início, ficando depois 250 após serem esculpidas.

S.M. – É mais difícil fazer uma obra desta dimensão?

C.A. – Tem uma adaptação própria. Exige um trabalho mais físico que tem de ser gerido com o tempo. Neste caso, foi muito curto, catorze meses. Foi um trabalho árduo e complicado, envolvendo apenas duas pessoas.

S.M. – Como se sente hoje?

C.A – Hoje é um dia importante para mim mas também o último dia do meu trabalho. Encaro estas coisas como trabalho até ao último segundo, neste caso a inauguração. Ficará aqui o meu registo desta obra tão importante.

S.M. – Como tem sido a reacção das pessoas?

C.A. – Pela primeira vez, na minha carreira, tive a possibilidade de usar uma ferramenta que é muito importante para quem produz arte pública, que são as redes sociais, permitindo auscultar as pessoas e o que pensam sobre o nosso trabalho. Ninguém pode fazer arte pública, pondo de parte a opinião das pessoas. A maioria das reacções foi espectacular, toda a gente falou muito bem.