Entrevista Nuno Canta, presidente da Câmara Municipal do Montijo: “A Câmara do Montijo tem as contas em dia”

Nuno Canta foi eleito presidente da Câmara Municipal do Montijo há dois anos pela lista do Partido Socialista. Sem maioria absoluta, defrontou-se com o chumbo do orçamento para 2015 pelos vereadores do PSD e da CDU mas alcançou uma gestão financeira equilibrada com as contas em dia. Este ano, conseguiu a aprovação do orçamento para 2016, onde se destaca a aposta nos apoios sociais e a redução de impostos como o IMI e IRS para as famílias bem como a isenção da derrama para as pequenas e médias empresas com volume de negócios até 150 mil euros. Das obras a realizar no próximo ano realça-se o monumento de homenagem aos ex-combatentes do Ultramar.

Florindo Cardoso

 Setúbal Mais – Após estar um ano em gestão por duodécimos, devido ao chumbo do orçamento camarário para 2015 pelos vereadores do PSD e da CDU, desta vez conseguiu que a oposição viabilizasse o documento para 2016. Qual a importância do orçamento na gestão do município?

Nuno Canta – O orçamento é um dos principais instrumentos anuais da gestão autárquica e um elemento fundamental de governação porque é aí que se espelham em euros todas as políticas que queremos implementar, nomeadamente a nível do investimento, do apoio social e do pagamento dos ordenados dos funcionários. Não ter um orçamento aprovado para 2015 levou a que a política desse ano, expressa naquele orçamento, não tivesse sido totalmente implementada, mas o continuar da que foi traçada em 2014. É um problema de acção política quando se bloqueia um orçamento para 2015 pela maioria negativa constituída pelo PSD e pela CDU. Daí a importância de ter um instrumento de gestão financeira e política da câmara municipal. A transposição do orçamento de 2014 para 2015, apesar de ser um cenário diferente, ainda assim permitiu não bloquear a actividade da câmara porque algumas coisas mantêm-se de ano para ano, como o pagamento dos ordenados dos funcionários, a política social e o apoio às escolas. Quanto aos investimentos, a situação é mais penalizadora. Tínhamos previsto para 2015 a construção de um monumento de homenagem aos ex-combatentes do Ultramar mas ficou suspensa e não conseguimos lançar o concurso, porque a verba não estava prevista no orçamento de 2014. Houve também um problema no investimento específico, como por exemplo a concretização da aquisição de um trator para a freguesia de Sarilhos Grandes, uma proposta resultante de um acordo com o presidente da junta de freguesia. Aliás, é impensável que a mesma força política que lidera essa freguesia (CDU) depois rejeite o orçamento, isso não faz sentido. Para 2016, a rejeição do orçamento seria mais grave porque temos a situação dos investimentos comunitários Portugal 2020, que terão de estar identificados, o que a não concretizar-se seria gravoso para o desenvolvimento e modernização da cidade e do concelho. Por isso, o PSD entendeu essa situação e absteve-se, viabilizando o orçamento.

S.M. – Quais são as grandes linhas do orçamento da câmara para 2016?

N.C. – A linha de orientação principal é continuar a suportar e desenvolver as questões sociais de apoio às populações mais vulneráveis, que passa pelo apoio às escolas. Somos um dos concelhos da península de Setúbal com maior volume financeiro de apoio à escola pública. Não basta dizer que defendemos a escola pública, temos de materializar isso em dinheiro. Fazemos também um trabalho fortíssimo no apoio social aos idosos com as academias seniores, o apoio às mulheres vítimas de violência doméstica, com a Casa Abrigo que temos protocolado com a União Mutualista, o refeitório para com as pessoas mais carenciadas e os sem-abrigo, que resulta de um acordo com a Misericórdia do Montijo e que permite oferecer a essas pessoas duas refeições por dia, cujo edifício em estrutura metálica foi ampliado. Outra prioridade é a criação de igualdade de oportunidades para a população, quer através da escola pública quer dos investimentos e apoios fundamentais na cultura, desporto e nas infraestruturas de qualificação da cidade. Aqui, temos uma questão particular que é a concretização das propostas do Pacto de Desenvolvimento e Coesão Territorial da Área Metropolitana de Lisboa que tem a ver com o Portugal 2020 e contempla nas questões da cultura a Casa da Música Jorge Peixinho, a recuperação de duas escolas do plano centenário (Luís de Camões e Joaquim de Almeida), a recuperação e qualificação em termos de eficiência energética das piscinas municipais, incluindo o interior do equipamento como os balneários, a ciclovia pelo antigo caminho-de-ferro entre a Jardia e Montijo, num projecto intermunicipal com a Câmara Municipal de Palmela que fará a ligação ao Pinhal Novo. Temos também uma luta grande na área da cultura que é a recuperação das ermidas de Santo António e de S. Sebastião, dois elementos patrimoniais importantes da cidade. No caso da ermida de Santo António, convidámos Fernanda Fragateiro, uma montijense nascida no bairro dos Pescadores, para fazer uma escultura para o seu interior. Pretendemos também proceder a uma série de pavimentações nas zonas rurais e a requalificação e repavimentação do Bairro da Bela Colónia, em duas fases, o acesso, cuja obra já está lançada, e depois avançar para as ruas interiores, projecto a lançar ainda no final do próximo ano. Vamos também proceder à pavimentação da rua Fernando Pessoa, em Sarilhos Grandes, estando a obra em andamento.

S.M. – E o monumento de homenagem aos ex-combatentes do Ultramar?

N.C. – Vai ser construído na rua José Neto (antiga rua Sacadura Cabral), frente às capelas do cemitério de S. Sebastião, numa zona relvada.

S.M. – A Câmara do Montijo continua a apostar nos benefícios fiscais para os municípes?

N.C. – Continuamos a ter uma política de abaixamento fiscal. Nos meus primeiros dois anos de mandato, baixámos sempre o valor do IMI (Imposto Municipal de Imóveis), aplicando uma taxa de 0,45%, o que representou uma redução de 10% face ao montante máximo permitido. Este ano, com efeito para 2016, optámos também pela redução, entre 5% a 15%, do IMI aplicável aos imóveis afectos à primeira residência de famílias com filhos, afectando 4923 famílias, permitindo a igualdade e justiça social entre as famílias pobres e ricas, e representando uma redução de receita cerca de 90 mil euros para a autarquia. A perda global de receita do IMI é de cerca de 1 milhão de euros para a autarquia. No IRS, optámos por baixar 1%, representando cerca de 470 mil euros de receita a menos para o município. Temos também a isenção de derrama para as pequenas e médias empresas, com volume de negócios anual inferior a 150 mil euros. É uma política fiscal que compensa as famílias mas ponderada o máximo possível, porque a Câmara Municipal do Montijo tem as contas em dia, pagando aos fornecedores a tempo e horas. Conseguimos isso num contexto de grande dificuldade financeira e de incerteza das questões financeiras, económicas e sociais do país e daí serem notáveis. Isso dá uma grande notoriedade e credibilidade à nossa capacidade de gestão e um grau de confiança à cidade e à economia local. Um orçamento equilibrado não é uma coisa de esquerda ou de direita mas algo importante para que um cidade cresça e se desenvolva. Isso leva a que os vereadores da oposição não tenham justificação do ponto de vista técnico e político para votar contra ao orçamento. A oposição por muito que lhe custe tem de reconhecer a boa gestão que estamos a fazer.

S.M. – Porque acha que  CDU vota sempre contra o orçamento?

N.C. – Por uma questão de catecismo político. Acho que a decisão da CDU é injustificável e ridícula e neste momento até está a votar contra as suas propostas. Votou contra o mapa de pessoal da câmara, que permite a entrada de mais pessoas para o sector da higiene urbana e jardins, quando há pouco tempo tinha apresentado uma proposta para recrutar funcionários para as juntas de freguesia para compensar a falta de trabalhadores. Há aqui uma incongruência e um contra-senso da CDU. Este ano, tal como aconteceu em 2014, tentámos ir ao encontro de muitas das suas soluções como a aquisição de um tractor ou a construção de um polidesportivo coberto na freguesia de Sarilhos Grandes, da mesma força política. Penso que cada um assumirá as suas responsabilidades e o povo do Montijo não é desatento e sabe perfeitamente ver quem coloca o catecismo político à frente dos interesses da cidade e penalizará fortemente estas pessoas. Não é possível fazer uma política de vale tudo.

S.M. – Qual o ponto da situação do aeroporto low-cost na Base Aérea do Montijo?

N.C. – A situação mantém-se. Os estudos continuam e estão a desenvolver-se com grande velocidade e há contactos entre a Aeroportos de Portugal (ANA) e a Base Aérea do Montijo (BA6) para tratar de problemas de logística e de funcionamento de uma unidade civil com uma militar. Temos aqui sedeada na BA6 a principal base de actuação da Força Aérea Portuguesa, com capacidade de transporte e acção de desenvolvimento e busca e operações de fiscalização, patrulhando a costa portuguesa. Isso terá de ficar salvaguardado com a instalação do aeroporto civil. Sabemos isso porque tivemos contacto com o comandante da BA6, durante uma visita de autarcas à pista, e percebemos a excelentes condições que tem para funcionar como infraestrutura aeroportuária civil. Já solicitámos uma reunião com a ANA para esclarecer a situação.

S.M. – Está convencido de que a obra vai avançar?

N.C. – Sim, porque há necessidade disso. No país há uma convergência de que esta solução é mais imediata e de que avançará. Pena é a CDU do Montijo não acompanhar e estar contra isto. É estranho porque o presidente da Câmara Municipal de Alcochete está connosco bem como o presidente da Câmara Municipal da Moita que é também presidente da Associação de Municípios da Região de Setúbal, ambos do PCP. Temos aqui um problema com  PCP do Montijo que está isolado. Ainda é mais curioso porque o chefe de gabinete do presidente da Câmara Municipal da Moita é vereador da Câmara Municipal do Montijo pelo que não se compreende se está ou não de acordo com o seu presidente. Estou confortável porque os meus colegas da região começam a manifestar-se a favor desta solução que prevê o alargamento do aeroporto da Portela, funcionando aqui o terminal n.º 2.

S.M. – Vivemos um momento político único no país com os partidos da esquerda unidos e prontos para formar governo. Como vê isso?

N.C. – Para já é uma solução nova e refrescante para a democracia portuguesa. A esquerda nunca se entendeu muito bem por várias razões históricas desde o 25 de Abril, o que colocou sempre o PS numa situação frágil ao ser atacado pela esquerda e pela direita. O secretário-geral do PS, António Costa, teve uma acção de mestre porque colocou a política no centro da questão, deixando de haver um discurso tecnocrata, onde o défice é o mais relevante. Esse acordo é também histórico criando em Portugal dois blocos políticos, um de direita e outro de esquerda.  Os partidos políticos na Europa estão a sofrer imenso e o PS português abriu a porta aos partidos mais à esquerda, sendo estes confrontados com a governação, obrigando-os a ter moderação. O PCP e o Bloco de Esquerda perceberam que se continuassem pelo caminho de apenas de reivindicação e de oposição sistemática a tudo não teriam futuro, porque ficariam sem quadros e sem capacidade de dar um contributo ao país.