Entrevista com Nuno Canta, presidente da Câmara Municipal do Montijo: “O aeroporto no Montijo consagra a cidade das duas margens”

No próximo dia 15 de Fevereiro será assinado o memorando de entendimento entre o governo e a accionista da ANA sobre a construção do novo aeroporto na Base Aérea n.º6. Para o presidente da Câmara Municipal do Montijo, Nuno Canta, esta infraestrutura aeroportuária “afirma uma questão de coesão territorial na região metropolitana de Lisboa”, criando mais riqueza e postos de trabalho no concelho.

 

Florindo Cardoso

Setúbal Mais – O memorando sobre a construção do novo aeroporto na Base Aérea n.º 6 vai ser assinado em 15 de Fevereiro?

Nuno Canta – Sim. O memorando de entendimento vai ser assinado entre o primeiro-ministro, António Costa, e o presidente da Vinci, Xavier Huillard, accionista única da ANA – Aeroportos de Portugal, S.A. (ANA), concessionária do serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil em Portugal. Os estudos realizados pela ANA confirmam que a localização do novo aeroporto na Base Aérea n.º 6 do Montijo tem consistência para, nos próximos 50 anos, sustentar o desenvolvimento da capacidade aeroportuária na região de Lisboa. Com isso resolve-se um problema de decisão, que se prolongou por décadas, quanto à localização de um novo aeroporto complementar ao existente em Lisboa. Primeiro foi Rio Frio, depois Ota, novamente Rio Frio, a seguir Campo de Tiro de Alcochete, mais tarde uma série de bases aéreas, e na qual o presidente da Câmara Municipal do Montijo sempre se posicionou no sentido de ser escolhida a Base Aérea n.º6. Este é o enquadramento simples porque alguns dizem que o presidente defendia o aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete e agora defende esta localização. Ora, eu e os autarcas socialistas do Montijo sempre defendemos uma nova infraestrutura aeroportuária, fosse nova ou complementar, no nosso território. Primeiro defendi a localização no Campo de Tiro de Alcochete, mas tendo-se verificado a anulação desta localização, é claro que debati-me pela Base Aérea n.º6.

S.M. – Qual a importância desta infraestrutura para o Montijo?

N.C. – A decisão de localizar o novo aeroporto na Base Aérea n.º 6 será lembrada para sempre na história do Montijo, que, desde a sua origem, foi sempre uma terra de transporte de pessoas e mercadorias. Somos um lugar de encontro de gentes e culturas e este aeroporto vem continuar essa história. É uma decisão que nos honra e projecta a nossa economia. Esta localização coloca-nos grandes desafios, que a cidade e os montijenses têm condições para os superar, como os relativos ao desenvolvimento urbano e possíveis impactes ambientais. Este aeroporto terá um grande impacto na nossa identidade, porque afirma a nossa história, e também temos a expectativa de que produzirá mais riqueza e postos de trabalho. Saímos há bem pouco tempo de um longo período de austeridade, que agravou muito o desemprego e as desigualdades e, por isso, o Montijo e o país precisam de políticas de apoio ao investimento, criando uma estratégia de desenvolvimento sustentável que defenda o ambiente e os recursos naturais. O aeroporto, para além destes aspectos locais importantes, alguns encargos e prejuízos, traz outros grandes benefícios, afirma uma questão de coesão territorial na região metropolitana de Lisboa. Temos a visão que esta infraestrutura aeroportuária no Montijo não corresponde à Portela+1 mas ao alargamento do Aeroporto Internacional de Lisboa ao Montijo, ou seja uma pista aqui e outra na Portela, isso afirma a coesão territorial e consagra a cidade das duas margens.

S.M. – Terá uma grande impacto económico no concelho?

N.C. – Sim. Os serviços de hotelaria e da logística irão desenvolver-se. Temos defendido que a carga aerotransportada venha para o Montijo e não ficar na Portela, com melhoria significativa no trânsito de Lisboa, distribuindo-o melhor entre as duas margens. Terá também um impacto no turismo, que é uma questão fundamental. Lanço o desafio aos concelhos vizinhos para começar a trabalhar numa comunidade maior a nível do urbanismo que é desenvolvido, para que conseguirmos melhorar a paisagem da península de Setúbal, tornando-a mais cuidada e atractiva, para fixar turistas na região. Do meu ponto de vista, é a pedra angular dos efeitos económicos que esta infraestrutura aeroportuária pode ter não só no Montijo como na região do Arco Ribeirinho e de Setúbal. Se nós autarcas, não conseguirmos ter uma ideia concreta de melhoria significativa de paisagem urbana de cada uma das nossas vilas e cidades da região, vamos ter dificuldade em fixar turistas na península de Setúbal. Para além isso, é fundamental a concretização de uma proposta que apresentámos na câmara de criar uma estrutura de transportes em metro de superfície desde o novo aeroporto até ao Seixal e Almada (Metro Sul do Tejo), que o PSD e a CDU votaram contra. Lamento que esses partidos não tenham a capacidade e a visão larga para perceberem que este Metro Sul do Tejo é determinante, já que contribuiria para o desenvolvimento económico para lá do Montijo. Se não tivermos um metro qualificado que permita aos turistas optarem por este transporte público para visitar as terras vizinhas, desde o Montijo à Moita e ao Barreiro, estas ficam sem uma ligação privilegiada ao aeroporto. Isto pressupõe uma visão mais estratégica para a península de Setúbal e lamento que a CDU, força liderante dessas câmaras municipais, não tenha em atenção estes pormenores importantes e com efeitos significativos para alguns dos concelhos que governa. É preciso dizer que na localização do aeroporto na Base Aérea n.º6 tivemos o voto contra da CDU. Cada um de nós tem de assumir a responsabilidade das coisas, que impedem o desenvolvimento do concelho. Lamento a falta de visão da CDU que a coloca sempre do lado errado da história.

S.M. – E o caderno de encargos que faz questão de não abdicar?

N.C. – Temos custos avaliados que são cerca de 15 milhões de euros. Caberá ao responsável pelo investimento executar os projectos associados a estes custos. Queremos salvaguardar uma questão essencial que passa pela cidade do Montijo precisar de ter uma ligação directa e com qualidade, dando conforto aos clientes do aeroporto. Para isso, são precisas infraestruturas viárias, como a conclusão da circular externa desde o bairro do Esteval, passando a estrada que vai para Alcochete e Samouco até ao Seixalinho, à entrada da Base Aérea n.º6. Todos os veículos provenientes do Sul terão de fazer este percurso para chegar ao aeroporto, não passando pelo centro da cidade. Exigimos também a construção da avenida do Seixalinho com ciclovia. Temos ainda a questão da Variante da Atalaia, projectada aquando da construção da Ponte Vasco da Gama e ainda não está concluída, porque o trânsito será mais intenso para quem vem de Pegões e do Alentejo e pretende chegar ao aeroporto. Depois, temos uma questão importante, e a própria ANA terá interesse nisso, que será uma nova ligação rodoviária da Ponte Vasco da Gama à circular externa. No âmbito ambiental, defendemos a valorização da zona ribeirinha entre o Saldanha e o Seixalinho, preservando as salinas existentes, e a construção de passeios pedonais e ciclovias, com pontos de observação de aves. Defendemos que o abastecimento de água a esta infraestrutura aeroportuária seja feito pelos Serviços Municipalizados de Água de Saneamento do Montijo. Fora desse pacote de 15 milhões, defendemos que a frota da Transtejo, empresa que procederá ao transporte fluvial pessoas entre o aeroporto no Montijo e Lisboa, seja modernizada e que opte por embarcações com componente panorâmica, para que os passageiros possam usufruir da paisagem do estuário do Tejo.