Entrevista com José Ramos Rocha, presidente da Sociedade Agrícola de Rio Frio: “Queremos transformar Rio Frio num grande centro de atracção turística”

 

A Sociedade Agrícola de Rio Frio está a desenvolver um projecto sustentável para um horizonte de 25 anos tendo como base o enoturismo. Valorizar a componente agrícola quer na vinha quer no montado com o lançamento de produtos próprios, apostar nas actividades equestres e turísticas reconvertendo o edificado são as grandes bases de desenvolvimento de Rio Frio que se poderá transformar num pólo de atracção para turistas nacionais e internacionais.

Florindo Cardoso

Setúbal Mais – Explique como começou o projecto de revitalização de Rio Frio?

José Ramos Rocha – Começámos a elaborar o Programa de Accão Territorial para Rio Frio e Barroca D’Alva, em 2008, em cooperação com as Câmaras Municipais de Alcochete e de Palmela. Nesse quadro, estabelecemos um horizonte de 25 anos para o território, tirando proveito da sua inserção na Área Metropolitana de Lisboa e da proximidade de 20 Km do aeroporto. Sendo um território com uma história e uma cultura próprias, projectou-se para este espaço um modelo de organização e de ordenamento que potenciasse o seu desenvolvimento sustentado. A partir daí, o projecto foi discutido e aprofundado, tendo os dois executivos camarários aprovado o modelo de como este território se organizará em termos de actividades nos próximos 25 anos. A partir daí, este projecto foi sendo consolidado e começámos a dar passos sucessivos na sua implementação.

S.M. – Começaram pela vinha?

J.R.R. – O primeiro elemento estratégico foi a recuperação de todo o imagético à volta da vinha. Rio Frio teve a maior vinha contínua do mundo com 4 mil hectares, com toda uma história dos finais do século XIX e princípios do século XX. Entre 2010 e 2013 fizemos uma plantação de 118 hectares, pelo que esta vinha “nova” entrou em produção em 2014, com os primeiros vinhos Herdade de Rio Frio branco, tinto e rosé. A vinha já está numa fase muito significativa de produção e ainda não atingiu o máximo, prevendo-se que este ano sejam produzidas cerca de um milhão e meio de garrafas. Em 2015, lançaremos o primeiro espumante mas queremos alargar a gama. Já temos o Moscatel de Setúbal e o Moscatel Roxo em processo de estágio.

S.M. – Ainda em relação ao vinho, poderá vir a ser alargado ao mercado internacional?

J.R.R. – Nesta primeira fase, queremos consolidar a recuperação desta imagem sobre o mercado nacional e a ideia é já este ano entrar no mercado internacional com estes vinhos. Durante este mês vamos fazer o lançamento de parte da nova gama e até ao final de 2015 estão previstos vários lançamentos da componente de vinho.

S.M. – A componente agrícola abrange outras áreas…

J.R.R. – Foi também nossa preocupação recuperar o montado que é estratégico e estrutural aqui na herdade. Nos últimos três anos, recuperámos toda a área do montado, nomeadamente na fertilidade do solo, melhorando a sua qualidade e fazendo inclusive renovações de certas zonas, numa área de três mil hectares. Ainda no campo agrícola, apostámos na reconversão do sistema de produção de vinhos, que pensamos ser um elemento estratégico ligado à própria exploração do montado, à melhoria do aproveitamento do potencial natural existente, tendo sido feita uma reconversão do sistema produtivo e orientando exclusivamente para a produção de extensivo. Ainda na componente agrícola queria destacar a manutenção de uma paisagem natural tratada que potenciasse o adequado aproveitamento da multifuncionalidade do espaço, que é paisagisticamente rico e que possui um património próprio, que estamos a tentar conservar e preservar.

S.M. – O turismo é um elemento estratégico?

J.R.R. – Definimos o turismo como um elemento estratégico para a valorização deste espaço e nessa área a animação turística, baseada no enoturismo (pela sua antiguidade e até pela produção de ânforas no passado, com um património muito rico em termos de história), e no turismo equestre, porque há toda uma história em torno de todo o processo de modernização da herdade, que contou no século XIX com o elemento de atracção animal e que depois deu origem à Cordoaria de Rio Frio, onde concebemos um projecto no campo do turismo equestre, centrado no Pólo Equestre de Rio Frio, que é também um centro da Federação Equestre Portuguesa. Depois construímos sobre o edificado existente duas outras estruturas: o Centro Hípico de Rio Frio (montado sobre a reconversão de antigas instalações pecuárias, onde a estrutura já funciona e recebeu eventos equestres) e a Academia de Equitação de Rio Frio (recuperando um picadeiro, antigas cavalariças e infraestruturas do princípio do século XX, com uma grande riqueza patrimonial mesmo ao nível da azulejaria), que está vocacionada para a visitação e para pequenos espectáculos equestres, além de boxes. Acolherá ainda no futuro o Museu do Cavalo, um Clube House e um hostel para cavaleiros. A obra está praticamente acabada e pensamos mostrá-la no final de Maio. Ainda em relação ao turismo equestre temos outros projectos. Para além das aulas de equitação e da formação nesse domínio, podemos promover visitas à herdade na lógica do lazer, potenciar treinos a cavaleiros e melhorar as suas participações em provas de uma actividade profissional sustentável. Penso que existem aqui condições objectivas para ser um Centro de Interesse Nacional com um projecto internacional no domínio do turismo equestre. Temos também previsto um Hipódromo de Corridas de Cavalos, que se encontra terminado do ponto de vista de arquitectura e que será edificado de forma faseada.

S.M. – A grande aposta é o cavalo?

J.R.R. – Sim diria que a grande aposta é o cavalo. A grande questão é se queremos aqui introduzir o cavalo para todos com a democratização do sector na lógica de o tornar acessível a toda a gente. Dependerá muito da forma como as estruturas se comportam e quais são os instrumentos públicos que aparecem para dar apoio a estas iniciativas. Temos vantagens muito grandes. Existe aqui uma grande paixão pelo cavalo, que tem que ser orientada em dois ou três sentidos, com vista a levá-los a uma prática que lhes permita ter sustentabilidade a médio e a longo prazo e isso é claramente um cavalo de desporto. A pessoa tem de encontrar no seio do exercício da sua actividade uma remuneração que permita ser profissional equestre, seja de que forma for. E para isso é preciso que o mercado cresça. Sem mercado, não conseguimos fazer funcionar este sector. Lembro que a região tem um clima que permite ter actividades equestres durante todo o ano e as condições do solo são muito boas para práticas de lazer e de endurance, sendo possível fazer infraestruturas a baixo custo, contrariamente a outras zonas do país. Temos a proximidade do aeroporto, bons acessos rodoviários e o cavalo lusitano, que é um ícone e tem procura. O turismo equestre é uma grande aposta, aliás não é por acaso que no rótulo dos vinhos Herdade de Rio Frio, juntamos o símbolo do cavalo.

S.M. – Fale-me do projecto do hotel rural…

J.R.R. – Rio Frio tem de ser visitável de forma organizada e ser diferenciado, integrando elementos históricos e da cultura. Queremos avançar com a componente do alojamento turístico, onde temos um projecto global da conversão do edificado que não tem uso social no sentido habitacional para instalar um hotel de charme. Depois temos os restantes edificados que vão ser transformados em lofts turísticos na lógica residencial. O monte de Rio Frio só tem valor enquanto rural porque se for urbano não marca a diferença, sendo que o nosso objectivo é adaptá-lo aos tempos modernos e que responda às necessidades de convívio e de visitação da Área Metropolitana de Lisboa, tentando recuperar alguns elementos da tradição. O hotel terá 57 quartos e 118 camas porque há duplexes, mais 47 apartamentos que vão consolidar esta oferta. Queremos transformar o monte de Rio Frio e a herdade num grande centro de atracção turística da AML, quer para o mercado nacional como internacional. É este o desafio que eu acho que é interessante para, em pleno início do século XXI, encontrar uma vocação sustentável para este território.